O QUE A CAMPANHA POLÍTICA ESTÁ ENSINANDO PARA
DILMA
por Luis Nassif
Na
entrevista a O Globo, Mirian Leitão perguntou a Dilma Rousseff como pretenderia
tirar a economia da situação atual. Dilma respondeu apontando o Pronatec, o
Ciência Sem Fronteira e o Sistema Nacional de Inovação. Não houve tempo para
tréplica mas, ao final, Mirian declarou-se insatisfeita com a resposta.
No entanto, as duas estavam certas; e as duas estavam erradas.
Vamos entender um pouco o que está por trás dessa discussão.
Por suas ligações com a cobertura financeira, os grupos de mídia
focam o desenvolvimento exclusivamente da ótica macroeconômica de curtíssimo
prazo. Há enorme dificuldade em entender políticas de médio e longo prazo,
trabalhando os fatores determinantes da competitividade sistêmica.
Por outro lado, só agora Dilma começou a elaborar – pela
primeira vez, se não me engano – o esboço de uma estratégia nacional de desenvolvimento
de longo prazo.
Políticas desenvolvidas ao longo dos últimos anos ganharam uma
dinâmica própria, todas convergindo para um mesmo modelo de desenvolvimento.
Mas, no seu isolamento polar, Dilma tinha olhos exclusivamente para o Banco
Central, a Fazenda, a inflação de curto prazo e os indicadores do PIB.
No discurso público, enxergava as diversas políticas de forma
isolada, sem captar o todo e, justamente por isso, tornando-se prisioneira de
visões de curto prazo e de descasamento da política macroeconômica da
estratégia geral.
O
reconhecimento da democracia social
A atual campanha política está sendo ótima por várias razões.
Primeiro, por obrigar Dilma a interagir com diversos setores
sociais e entender melhor o desgaste e os erros de decisão provocados pelo
isolamento e pela arrogância administrativa.
Na eventualidade de um segundo governo Dilma, certamente ela
terá aprendido que o governo é uma conjunção das diversas forças que compõem a
nação. Ela é a representante de um projeto, não a dona do projeto.
Os Ministérios precisam representar a diversidade econômica e
social do país, colocando lideranças agrícolas na Agricultura, industriais no
MDIC, sociais nos diversos Ministérios sociais. O equilíbrio se dá estimulando
as políticas Inter setoriais, com todos os setores sendo ouvidos na definição
de cada uma delas – e a presidente arbitrando interesses conflitantes.
Ela tem que ser a maestrina, não a solista da orquestra.
O
discurso político
Segundo, por fazê-la assumir o discurso político.
E não se entenda por “político” nenhuma conclamação às massas,
mas a explicitação de projetos de governo, em todos seus ângulos, das políticas
sociais às industriais, passando pela diplomacia e pelo Banco Central, tudo
juntando-se em um todo lógico e compreensível. E, nessa explicitação,
identificando as diferenças com os projetos dos dois outros candidatos.
O maior papel de um presidente não é sequer o poder da caneta,
mas a capacidade de entender os novos caminhos e transmiti-los de forma clara
para o país. É esse discurso que unifica ações, define rumos, induz todos a caminhar
na direção proposta.
O novo
projeto de desenvolvimento
O projeto de desenvolvimento desenhado consiste da seguinte
lógica:
O Brasil tornou-se uma democracia social moderna antes de ter-se
tornado uma economia competitiva. Não conseguirá repetir o caminho de outras
economias que, no início, exploravam salários baixos, para avançar, no momento
seguinte, na conquista de inovação, melhorando simultaneamente emprego e
competitividade.
Em função dessas características, o desenvolvimento econômico
brasileiro passa pelas seguintes etapas, já em andamento.
1. Na base da pirâmide, políticas
sociais e regionais inclusivas e reforço do modelo educacional.
2. No meio, investimento no ensino
técnico e na regionalização do ensino superior.
3. Amarração de todas as peças da
pesquisa em um Sistema Nacional de Inovação, ligando recursos às necessidades
de desenvolvimento regional e de atendimento das demandas da indústria.
4. Montagem de sistemas de financiamento
da inovação e dos investimentos, através dos bancos públicos e dos recursos
orçamentários. Utilizá-los como fator de indução para o capital privado.
5. Identificação de áreas prioritárias
para a nova etapa do desenvolvimento. Dentre elas, aquelas diretamente ligadas
às compras públicas (infraestrutura, saúde, educação e defesa), às vantagens
competitivas (agronegócio, mineração) e às economias de escala (produtos de
consumo popular). E serão mais fortes, se mais fortes estiverem ligadas ao
conceito de bem estar público.
Para se compatibilizar com o desenvolvimento sócio-político, não
se pode mais fugir de um conjunto de princípios:
1. As políticas públicas precisam ser
abertas, com participação da sociedade – empresários sendo ouvidos para
políticas setoriais, movimentos sociais e ONGs para políticas sociais e assim
por diante. O Palácio tem que abrir portas, janelas e cortinas.
2. Tem que se fazer a opção preferencial
pelo novo e avançar nas propostas de democracia digital.
3. Tem que se aprimorar o federalismo
brasileiro e a maneira de trabalhar o orçamento.
As
demais pernas do modelo
Nessa estratégia deverão ser amarradas a diplomacia e a política
macroeconômica.
Do lado da diplomacia, aproveitar a ascensão dos BRICs –
inclusive com a criação do banco – para negociar grandes investimentos em
parceria na infraestrutura.
Do lado da macroeconomia, perseguir a redução dos juros, a
política cambial competitiva, uma política fiscal responsável, abrindo espaço
no orçamento para os grandes investimentos públicos necessários.
É evidente que a última perna do modelo – justamente aquela a
quem Dilma dedica atenção especial – está falhando.
O sistema de metas inflacionarias esgotou-se, mas continua
mantido no Banco Central. Esse sistema compromete o orçamento, para o pagamento
de juros, compromete a política cambial, permitindo a invasão dos importados.
Para corrigir esses problemas, Dilma toma uma série de medidas pontuais, que
desarruma a política fiscal.
Juros elevados atrapalham a realocação da poupança privada e dos
fundos de pensão. Impede que os bancos públicos cumpram sua função de agentes
indutores da poupança privada.
Dilma não respondeu às questões de curto prazo de Mirian por
duas razões.
Primeiro, pela dificuldade de admitir os erros da macroeconomia.
Depois, por não poder antecipar correções de rumo, pelas óbvias implicações
sobre o mercado.
Se tiver a humildade de aproveitar as lições da campanha
eleitoral, poderá ter um segundo mandato marcante.
JORNAL GGN 13 de setembro de 2014 às 14:24
Adaptado pelo Blog do SINPROCAPE 14.09.2014 07h00m
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