'REFORMA' TRABALHISTA SERÁ ALVO DE DISPUTA NAS RUAS
E NOS TRIBUNAIS
Para representantes de
trabalhadores e especialistas em direito, em debate no Sindicado dos
Metalúrgicos do ABC, país já provou que é possível criar empregos sem reduzir
direitos; segundo os advogados trabalhistas, a nova legislação ainda não está
consolidada e será objeto de disputa nos tribunais e instâncias superiores
As novas legislação trabalhistas sancionada pelo governo Temer, e
que entraram em vigor no último sábado (11), não estão consolidadas, e serão
alvo de disputa jurídica, nos tribunais do trabalho e instâncias superiores, e
política, nas ruas, nas fábricas e nas eleições do ano que vem. Essas foram as
impressões compartilhadas por especialistas do direito, sindicalistas e
políticos, em debate promovido pelo Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, realizado
nesta segunda-feira (13), em São Bernardo do Campo.
Eles apontaram que as mudanças na
legislação foram feitas sem que os trabalhadores fossem consultados, e atendem,
portanto, somente aos interesses da
classe patronal, que pretende enfraquecer os sindicatos durante as
negociações e criar obstáculos para o acesso à Justiça do Trabalho. O debate
sobre o dia seguinte à reforma trabalhista também foi acompanhado de
perto pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que defende a realização de
um referendo revogatório sobre essa e outras medidas do governo Temer.
Ao contrário do discurso oficial do
governo, que alega que as novas regras estimularão a criação de novas vagas de
emprego, os participantes foram unânimes em dizer que o que, de fato, vai
aumentar com a reforma trabalhista é a precarização das relações do
trabalho e a queda dos rendimentos gerais dos salários.
Para o presidente da CUT, Vagner Freitas, o efeito geral é que, se essa
nova legislação não for revogada, todos os trabalhadores com o atual modelo de
contratação serão demitidos, e recontratados de maneira precarizada, na forma
de terceirizado, autônomo ou intermitente.
Ele também criticou o dispositivo que consta da nova lei que considera
que as negociações coletivas terão prevalência sobre a legislação, até mesmo
quando retirarem direitos. Segundo Freitas, negociação sem a presença do
sindicato, como legítimo representante dos trabalhadores, não pode ser
considerada com uma negociação coletiva. "Não há negociação coletiva sem
um sindicato forte", ressaltou.
Vagner defendeu a união de sindicatos em macro-setores, que reúna todo
um determinado seguimento de trabalhadores, para, assim, terem maior poder de
negociação e menores custos de manutenção de estruturas de assistência
jurídica, por exemplo.
Empobrecimento
A senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), presidenta do partido, destacou que
as mudanças implementadas pela reforma trabalhista vão levar à queda dos
rendimentos dos trabalhadores, dadas as modalidades precarizadas de
contratação, reduzindo, assim, o consumo, impactando no crescimento da
economia. Outra consequência apontada por ela é o agravamento da concentração
de riquezas, no país.
"O custo para a sociedade é muito alto. Diminuem direitos para não
mexer na lucratividade. Vamos ter de novo uma concentração de riquezas na
nossa sociedade. Hoje, seis homens tem a riqueza equivalente a 100 milhões de
brasileiros", ressaltou a senadora.
Ela também afirmou que "é mentira" que a flexibilização da
legislação vai criar novas vagas de emprego, e destacou que, durante os
governos do PT, foram criadas 22 milhões de empregos formais sem precisar tirar
direitos. "Pelo contrário, aumentando." Segundo ela, os impactos serão
ainda mais graves para categorias com menor nível de organização sindical.
Inconstitucionalidade
Ao desembargador Davi Furtado Meirelles, do Tribunal Regional do
Trabalho de São Paulo (TRT-SP), e à procuradora Sofia Vilela de Morais e Silva,
do Ministério Público do Trabalho (MPT), coube à crítica aos pontos
considerados inconstitucionais. Por se tratar de uma legislação ordinária, as
novas regras que entrarem em choque com os preceitos constitucionais ou, ainda,
com acordos internacionais, não deverão ser acatadas, defendem.
Eles também ressaltaram que a opinião do ministro do Tribunal Superior
do Trabalho, Ives Gandra Martins Filho, que afirmou que é preciso retirar
direitos para promover o emprego, é minoritária entre os operadores do Direito
do Trabalho. "A Justiça do Trabalho não é imparcial, ela tem lado. Tem de
proteger o trabalhador. Foi feita para isso", afirmou o
desembargador.
Meirelles disse se tratar de uma reforma "ilegítima", pois foi
feita por um governo sem voto, sem discutir com os interessados: os
trabalhadores e sindicatos, em primeiro lugar, e os juízes e procuradores do
trabalhado, que também não foram chamados a opinar. "Não é segredo para
ninguém que essa reforma foi feita para o empresário, não para o
trabalhador", ressaltou.
"No ordenamento, o juiz tem de aplicar a lei. Mas é função do juiz
interpretar. Não fosse isso, o direito seria ciência exata. Não é, é
humana." Segundo o desembargador, "todo e qualquer direito tem de
observar a regra da melhoria", e o retrocesso social é vedado pela Constituição.
"Quando se fala sobre prevalência do negociado sobre o legislado, é
redução. Não pode negociar para retirar direitos. Todas as vezes que isso
acontecer, a Justiça do Trabalho vai ter de dizer que é inconstitucional. Não
adianta o empresário reclamar", disse o magistrado. Meirelles afirmou que
as novas regras vão criar insegurança jurídica muito grande, mas disse
acreditar que, com o tempo, se formarão jurisprudências favoráveis aos
trabalhadores, afastando as inconstitucionalidades, a partir da interpretação
dos juízes do Trabalho.
A procuradora Sofia Vilela de Morais e Silva destacou que a CLT,
desde a sua primeira publicação, em 1943, foi seguidas vezes modificada desde
então, refutando argumento de que a legislação trabalhista precisava ser
modernizada. "O que a gente vê é que é uma proposta que, em vez de
combater o descumprimento às normas, dificulta o acesso à Justiça."
A reforma inibe o acesso à Justiça porque determina que o trabalhador
arque com as custas de um processo, caso seja derrotado nos tribunais. Segundo
Sofia, essa mudança acaba com o sistema de assistência jurídica gratuita, e
serve, mais uma vez, pare reduzir custos do empregador com processos, e
permitir que este descumpra a lei com chances menores de ser processado.
Ela também rebateu argumento de que a redução no custo de contratação da
mão de obra contribua para a criação de novas vagas de emprego. "Não há
geração de emprego. No máximo, empregos precarizantes. Nenhuma empresa
contrata mais, se for mais barata a mão de obra. Contrata o
necessário."
O anfitrião do evento, o presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do
ABC, Wagner Santana, afirmou que a grande tarefa dos trabalhadores será
fortalecer os sindicatos para fazer o enfrentamento. "Nós, trabalhadores
metalúrgicos da CUT, resistiremos à implementação e efetivação dessa
legislação. A tarefa agora é fortalecer os sindicatos como principais e únicos
interlocutores na relação capital-trabalho", disse.
Segundo ele, a "reforma" transforma o Brasil não em um país
com um mercado consumidor fortalecido, mas em um país exportador, com mão de
obra barata. "O Congresso, que não tem legitimidade moral para fazer
essa reforma, a terceirização nem reforma da Previdência. Fez uma alteração que
muda todas as relações, sem ouvir uma parte essencial, os trabalhadores e o
movimento social que os represente."
Fonte: BRASIL 247 - 13 de novembro 2017 - 16h29m
Adaptado pelo Blog do SINPROCAPE - 14.11.2017 - 05h37m